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Autonomia tecnológica como uma constelação de experiências

[Texto da Introdução do Guia]
Esta proposta metodológica (guia anexo em PDF) visa dar algumas recomendações práticas para a criação e implementação de programas de formação relevantes e contextualizados que favoreçam a criação e consolidação de projetos comunitários de comunicação e telecomunicações, particularmente de redes comunitárias.[1]

Este é um convite para continuarmos a tecer a autonomia tecnológica, compartilhando nossas experiências e conhecimentos nestes programas de formação. De modo particular, o guia é dirigido a pessoas, organizações e comunidades que veem a formação como um processo crucial para promover processos de comunicação e telecomunicações próprios em seus territórios ou regiões. Sabemos que existem iniciativas em todo o mundo que têm gerado estratégias de formação muito valiosas e queremos dialogar com elas para refletir sobre as práticas e metodologias que norteiam esses caminhos. A proposta é deter um pouco o ritmo acelerado de nossas vidas para (re)considerarmos nossos horizontes e estratégias de formação e (re)formularmo-nos a partir dessas reflexões. Trata-se de encontrarmo- nos e olharmo-nos para tecer em conjunto experiências que possibilitem continuar construindo esses caminhos para “outros mundos possíveis”, por meio do uso e da transformação das ferramentas de comunicação.

Na primeira parte queremos compartilhar nossa visão sobre as redes comunitárias, a autonomia tecnológica e a formação. Nela expressamos a reflexão conceitual da qual partimos, para então passarmos, na sequência, a compartilhar alguns exemplos da diversidade de experiências de formação existentes e relatar um pouco da nossa experiência na construção do Programa de Formação de Promotores Técnicos em Telecomunicações e Radiodifusão “Techio Comunitario”. Na segunda parte, propomos uma série de recomendações para a concepção e a implementação de programas de capacitação por meio das etapas de construção do cenário, de ver, pensar, agir e avaliar, com base na Pesquisa- Ação Participante (PAP).

Vamos começar com uma metáfora. Quando direcionamos o olhar para o céu noturno, se as nuvens e as luzes artificiais nos permitirem, veremos uma série de estrelas que nos fazem sentir a imensidão e a realidade do universo que habitamos. As estrelas que compõem esse grande mapa do lugar onde vivemos parecem estar imóveis e ocupar a mesma posição. A história da humanidade está intimamente ligada a esse mapa estelar. As diferentes civilizações agruparam as estrelas por meio de linhas imaginárias que explicam os arredores e são baseadas nas cosmovisões dos povos que desenharam esses padrões. Isso é o que chamamos de constelações.

Essas linhas imaginárias nos permitem compreender a diversidade de explicações que temos sobre nossas vidas. Elas também permitiram o desenvolvimento de civilizações, por exemplo, por meio da navegação por todo o planeta, ou estabelecendo os ciclos da agricultura. Nesse sentido, sem perder de vista todo o conhecimento que foi gerado por meio delas, ao enquadrá-las como formas únicas de compreender essas ligações entre os astros, elas podem ser também um reflexo da destruição histórica de saberes e crenças e dos exercícios de poder de certas civilizações sobre outras.

Nossa visão do universo e das estrelas que o compõem é parcial. O que podemos ver é determinado pela posição da Terra nessa vastidão. Também o tempo que percebemos é diferente, as luzes das estrelas que chegam até nós podem ser de estrelas que estão a anos-luz de distância e o que vemos são acontecimentos ocorridos muito antes de nós existirmos. Além disso, em nossa época temos limitado a possibilidade de olhar para as estrelas por querer diminuir a escuridão natural dos nossos espaços, deslumbrando- nos com as luzes das cidades que nos impedem de ver a grandeza do universo que nos rodeia.

Queremos partir do céu noturno e das constelações como metáfora, pois nos permitem entender o que é a comunicação e suas tecnologias, e por que é importante pensar a formação tecnológica para o desenvolvimento de projetos comunitários de comunicação e telecomunicações a partir de uma perspectiva diferente.

Voltemos mais uma vez o olhar para o céu estrelado, pensemos nessas luzes, em quão distantes elas nos parecem e em todas as histórias que se passaram desde que olhamos para elas. Pensemos agora em tudo o que nosso olhar não alcança, no que ele não consegue captar, no que também se esconde durante o dia pela luz do sol, ou ainda nos espaços escuros entre uma estrela e outra. Imaginemos também os milhares de anos que se passaram para que a luz entrasse por nossos olhos. Certamente nosso pensamento será dominado por essa imensidão de relações, de astros, espaços e tempos.

Podemos entender nossa história como esse céu estrelado. A grande quantidade de astros e espaços aparentemente vazios que se encontram nesse horizonte constituem todo o acúmulo de diversidades que acompanham nosso caminhar. Dentro de todo esse espaço, as pessoas são apenas uma minúscula parte, mas aí estamos nós, somos parte do conjunto de relações que tornam possível a existência do todo. Mas também existem todas as espécies vivas e não vivas com as quais interagimos, como montanhas, vales, oceanos, rios, animais, plantas, fogo, terra, ar e água. A comunicação é esse vasto processo histórico que faz todo o sistema funcionar, é aquela energia que permite que as relações sejam geradas entre as partículas para formar ambientes tão amplos quanto o próprio universo.

A comunicação entre as pessoas é uma forma particular dessas relações, que foi adquirindo características próprias no decorrer da história e cada povo encontrou formas diferentes de desenvolvê-la. A linguagem é um mecanismo pelo qual nomeamos o mundo e por meio do qual compartilhamos explicações sobre nossas realidades. No entanto, a língua não é somente o que falamos ou escrevemos, o que se desenvolveu por meio do aparelho fonador ou dos símbolos escritos é apenas uma parte de um complexo sistema de troca de experiências e conhecimentos que possuímos. A comunicação é um conjunto de formas pelas quais expressamos o nosso sentir e pensar, que inclui, entre outras coisas, a forma como nos vestimos, o que comemos, os nossos gestos e olhares, a forma como nos organizamos ou construímos nossos habitats. Embora exista uma tendência de unificar essas formas de comunicação, as diferentes maneiras de fazê-lo continuam sendo um dos elementos que nos permitem continuar nossa existência em um mundo cada vez mais abalado por nossos desejos de poder sobre o que nos rodeia. Ou seja, a comunicação não é apenas aquela mediada pelas tecnologias, é um processo muito mais amplo e diverso no qual se tecem relações entre as pessoas e com a natureza, que tem formas particulares de se desenvolver e que permite que nosso meio continue caminhando. A comunicação tem muito mais a compreender do que aquilo que percebemos à primeira vista, nossos limites físicos e mentais nos impedem de ver todas as formas de comunicação que existiram ao longo do tempo e do espaço.

Agora vamos pensar nas tecnologias de comunicação como constelações, como traços imaginários que permitem que essas relações sejam estabelecidas entre estrelas que estão distantes no tempo e no espaço. Essas ferramentas de comunicação, desde os códices de civilizações antigas até a rede global de internet, têm buscado eliminar as distâncias espaciais e temporais visando compartilhar conhecimentos e saberes, de modo a ultrapassar limites geográficos e históricos. Essas tecnologias não são neutras, elas foram criadas com fins específicos e respondem a lógicas de poder e dominação. São linhas imaginárias criadas sob uma visão particular de mundo e que pretendem ser ferramentas para que essa forma de compreender penetre em outras pessoas. No entanto, existem outras constelações que podemos traçar sobre elas, outras visões que geraram linhas distintas e que as utilizaram e transformaram para responder aos seus modos de vida e sonhos a realizar. Para tanto, foi necessário romper com as “verdades únicas” existentes sobre as tecnologias, visualizar seus riscos e gerar mecanismos para potencializar suas possibilidades.

Queremos fazer um convite para retomar essa visão da comunicação e de suas tecnologias de uma maneira ampla para construir “outros mundos possíveis”. Para tanto, acreditamos ser importante partir do fato de que, assim como as constelações podem ter implicações para que certas formas de vida exerçam seu domínio sobre outras, as tecnologias também podem ser mecanismos para se estabelecer relações de poder. Ao mesmo tempo, se pensarmos que é possível criar outras linhas, encontraremos maneiras particulares de compreendê-las e de nos apropriarmos delas, reforçando assim nossos sonhos, desejos e esperanças.[2]

A formação nesse esquema de relações também é uma forma de comunicação, uma maneira particular de compartilhar experiências e conhecimentos com outras pessoas. Consideramos que, quando falamos em formação para processos comunitários de comunicação e telecomunicações, a diversidade de maneiras de (nos) formar tem a ver com essas formas próprias de comunicação e com a criação de novas constelações tecnológicas que as reforcem. Esse é o ponto de partida da proposta deste guia. Com essas ideias em mente, a proposta é pensar em programas de formação que visem uma primeira instância de especialização para pessoas que não estão familiarizadas com a criação, operação e gestão de redes de comunicação. O objetivo buscado nesses programas pode ser a criação de uma rede de promotores e promotoras técnicos(as) que atuem na resolução de problemas tecnológicos, organizacionais e de sustentabilidade juntos daqueles que os enfrentam, perdendo o medo da tecnologia e buscando uma solução para falhas comuns. Em geral, é um programa que permite construir uma comunidade de troca de experiências e conhecimentos sobre esses temas específicos. Uma vez alcançados esses objetivos, podemos começar a pensar em como apoiar a especialização em diferentes áreas temáticas, de modo a reforçar o conhecimento aprendido e atender aos interesses das pessoas que participaram do programa.

Quando falamos em programa de formação, referimo-nos a uma série de ações e estratégias que são desenvolvidas para cumprir um objetivo geral do processo de formação. O convite que fazemos é que, a partir desse processo, seja possível compartilhar os saberes, experiências e conhecimentos necessários nos campos técnico, econômico, político, regulatório e social necessários à criação e consolidação desse tipo de experiência de comunicação.

As formas que esses programas podem assumir são muito variadas, com tempos, técnicas, conteúdos e metodologias diferenciadas dependendo do contexto em que são desenvolvidas. Propomos a concepção de programas de formação que nos permitam atingir os sonhos e objetivos estabelecidos em médio e longo prazo para o fortalecimento dessa rede de promotoras e promotores técnicos. Ainda que conheçamos o valor que têm por si só os cursos e oficinas isoladamente, consideramos como chave essencial e eixo de partida essa visão em conjunto de ações e estratégias apresentadas num programa de formação.

Para finalizar este preâmbulo, queremos compartilhar que esta proposta metodológica só foi possível graças às muitas experiências de formação em comunicação e telecomunicações das quais participamos. Agradecemos a cada pessoa e organização que, direta ou indiretamente, fez parte da construção deste guia. As recomendações aqui apresentadas são baseadas em nossa própria experiência, nossas reconstruções e aprendizagens. Ao compartilhá-las, esperamos que elas ressoem em outros espaços e territórios.

É possível criar novos traçados nas constelações que nos aparecem no céu estrelado! Vamos continuar repensando a nós mesmos e repensando a comunicação, as tecnologias e a formação para construir coletivamente “outros mundos possíveis”!

[1] Embora o guia se destine a desenhar e implementar programas de formação para a criação ou consolidação de redes comunitárias, acreditamos que a metodologia e as propostas aqui apresentadas podem ser úteis para outros tipos de projetos de comunicação e processos de organização comunitária.

[2] Com base na experiência de acompanhamento de comunidades indígenas no México e na América Latina no desenvolvimento de estratégias de comunicação comunitária e no uso das TIC pertinentes ao território, elaboramos um guia que nos permite repensar a comunicação e suas tecnologias para encontrar novos caminhos possíveis em direção à autonomia tecnológica. Baca-Feldman, C. & Parra, D. (2020). E se Repensarmos as Tecnologias de Comunicação: Propostas Metodológicas para Planejar e Implementar Projetos de Comunicação Comunitária. Redes por la Diversidad, Equidad y Sustentabilidad A.C. (https://bit.ly/3t0bplZ)

Publicado pela Associação para o Progresso das Comunicações (https://www.apc.org)
Coordenação de publicação: Carlos F. Baca-Feldman
Colaboradoras: Daniela Bello López, Alejandra Carrillo Olano, Daniela Parra Hinojosa e Alma Patricia Soto Sánchez
Fotografias interiores: Itzel Muñoz Mora, Daniela Parra Hinojosa, Karla Velasco Ramos e Rhizomatica
Projeto gráfico: Mónica Parra Hinojosa
Tradutores: Laura Valente e Daniel Lühmann